segunda-feira, 30 de setembro de 2024

FACHADAS DE SOLIDÃO

por Francc Neto. 
POETA, FILÓSOFO, DESIGNER E ARTISTA PLÁSTICO

Foto tirada da internet: Crédito: Adobe Cultura Shock

Caminhar. Sempre a pé. Nas cidades grandes, onde o concreto se expande e a alma encolhe, eu busco aquilo que a velocidade dos carros não permite ver. Ruas esquecidas, avenidas longas, becos sem saída onde o tempo parece adormecido. Como se eu estivesse pintando com os olhos, encontro na melancolia das fachadas algo que só a cidade em silêncio pode oferecer.

São Paulo, 87. Eu vagava pelas ruas, como quem busca fragmentos de uma história esquecida. A sensação de abandono não me traz tristeza, mas uma alegria quase tímida, ao ver o que o tempo deixa para trás. A cidade é minha tela, e a fotografia, um ato pictórico. O clique não é pesado, não carrega o peso da realidade que se esvai. Ao contrário, é leve, quase flutuante, como um sopro silencioso que eterniza a beleza do que é deixado de lado.

Entre paredes manchadas e janelas sem alma, encontro a poesia do vazio. Como no filme Paris, Texas, é uma cidade grande, mas não há ninguém por perto. Nem uma alma, nem um som. Mas para mim, é exatamente ali, na ausência, que encontro a verdadeira presença. O abandono também é um ato de criação, uma felicidade quieta, escondida na textura de uma parede envelhecida.

Cada passo é uma pincelada no invisível. E cada foto é um traço, um fragmento de poesia que não se explica, apenas existe, por si só, como um eco perdido no tempo.

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