no bairro dos Bancários, em João Pessoa.
Ultimamente tenho dormido com o
improvável. Nesse estado de incerteza e até ambíguo que me tem roubado o sono, as noites sempre tem sido moribundas. E aí o pouco de sono que me é permitido pelo olhos profundo da insônia, as avalanches de sonhos inesperados, muitos irregulares, abstratos, surreais e
psicossomáticos das minhas trevas, têm revelado imagens que eu não precisei
sentir e nem tão pouco imaginei viver ou ter como referência para o meu
convívio material ou espiritual.
Esse tal comportamento dimensionado e
ilógico, foi quebrado nesta noite de quinta-feira passada para a sexta-feira
seguinte, quando embora não tinha tido um sono normal, como deveria ter, pelo
menos os sonhos que insistia em povoar meu sono, não tiveram no final um
desfecho fantasmagórico com dantes. Eles vieram! Mas vieram com luz; com cores;
coisas só do bem. Coisas de um Espirito Santo com todos os Arcanjos do céu. De
Deus mesmo.
Amanheci com o sol bonito da manhã
iluminando o mundo e, com disposição para enfrentar a mesmice do dia-a-dia.
Então eu me preparei com todo gás possível, para desenhar a minha passagem por
aquela sexta. É que eu tinha um trabalho para começar numa escola pública e
assim, saí de casa a pé, por que na real, professor pobre que não teve
oportunidade ainda, vive um incômodo cotidiano a margem da vida, andando muitas vezes a pé mesmo, oferecendo a cara, de graça, aos ardentes raios solares do dia-a-dia.
E foi para esta escola... Chegando
lá, foi até a biblioteca aonde ia me encontrar com os alunos, em número de doze, inscritos na
atividade previamente programada. Entretanto tal foi a minha
surpresa, só compareceu uma aluna. Dei uma volta pela escola, procurando mais
alunos para compor um número maior que possibilitasse dar início a essa
atividade. Toda minha procura foi em vão, nada encontrei. Porém quando voltei à
biblioteca, já havia três alunas na mesa a minha espera. Tirei o notebook da
bolsa e comecei mostrar um vídeo para eles.
Quando dei início às explicações das
etapas do trabalho que ia fazer com os mesmos, uma das alunas em condição
social bastante carente - pois morava em uma comunidade próxima a escola
desprovida da ação do poder público, começou falar da sua situação, onde morava
e, das dificuldades de se deslocar até aquela unidade escola, já que cuidava
dos seus irmãos menores na ausência da mãe. Disse também que apesar de todo,
fazia um esforço para participar do programa "Mais Educação", além de
frequentar as aulas de violão, cuja atividade já havia proporcionado a ela,
tocar o instrumento e, que já estava tocando muito bem.
Fiquei contente com seu esforço e
dedicação da aluna as aulas de violão. E aí eu perguntei: Você não tem violão
não? Ela respondeu: Não! Aprendi com os da escola. Senti uma seriedade extrema
na fala naquela aluna. Seu modo de vestir; de falar; das dificuldades da sua
condição de ser carente humilde e, da vontade em ser gente, mas gente decente.
De ter um futuro melhor.
Parei a conversa e em um instante
olhei nos seus olhos e vi que nos seus relatos, havia verdades. De repente veio
uma contração no coração e uma quase voz martelando a cabeça, os ouvidos,
pedindo que eu desse um violão aquela garotinha. Aí eu disse: vou te dar um
violão e quando terminar a aula você já vai pegar.
A menina foi no céu e voltou de tanta
alegria. A nossa interação foi interrompida com barulhos e quebra-quebra
produzidos dentro daquela unidade de ensino e, em seguida, crianças desesperadas gritando,
vindo em direção à biblioteca onde estávamos. Corri para fora, para ver o que
estava acontecendo. Ninguém dizia nada, professores corriam para todos os
lados. Funcionários desesperados fechavam as salas de aulas.
Procurei me fixar em algum ponto da
escola, onde poderia vim aquela barulheira toda. Uma criança corre em minha
direção e grita: Professor é naquela classe, não entra lá não, por favor. Eu,
mesmo ouvindo o pedido daquela criança, corri em direção a sala e me deparei
com uma professora em desespero tentando proteger duas alunas que ainda se
encontrava naquela sala de aula.
Quando entrei, vi uma desordem e uma
desarrumação na sala e um menino em desespero gritando, derrubando, quebrando
tudo: cadeiras, mesas, materiais escolares pelo chão. A professora correu e eu
tentei acalmar aquele garoto, que aparentemente estava com uma força
sobrenatural.
Agarrei-me com ele e segurei forte.
Ele começa a me morder e, quando se soltava jogar cadeiras e que estivesse
próximo dele, em minha direção. A força do garoto era algo incomum que senti
dificuldades de conter a sua fúria. E assim tentando, dá uma de exorcista,
tirei com toda dificuldade o garoto da sala para o corredor com ele gritando
"eu não sou doido", "eu não sou doido". Segurei e pedi que
trouxesse água. Como! Os funcionários da escola não tiveram coragem de se
aproximar do garoto.
Como socorro nenhum chagava para me
ajudar, com todo esforço que tive naquele momento, levei garoto até o bebedor e
aí, ele foi se acalmando, se acalmando. Depois de estar com ele praticamente no
colo, um pouco mais calmo, a professora do garoto apareceu e levou o mesmo para
uma sala reservada.
Senti que naquela sexta-feira, fiz
duas boas ações: A de ter dado um dos dois violões novinho que tinha em casa -
o que estava autografado por Zé Ramalho e que eu não estava usando, a uma aluna
que necessitava de um. Doei pesando no futuro daquela aluna. Quem sabe a mesma
não se tornaria uma grade musicista. E a outra a ação, foi a de ter contido,
não sei como, aquele aluno enfurecido, descontrolado, que estava quebrando
tudo dentro da sala de aula.
Em casa, quando cheguei, lembrei-me
dos sonhos positivos que havia sonhado na noite anterior. Ou seja, depois de
uma sequência de sonhos inspirados nas telas de Salvador Dalí e outros
experimentados nas práticas freudianas, acabei colocando em xeque-mate naquela
sexta-feira, o que a razão determinou como deveria ser o meu dia, para aquele sexta-feira.
Cleudimar Ferreira
Texto publicado no Facebook, em 23.Ago.2015
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