por: João Batista de Brito
Há um filme de Woody Allen em que o
protagonista se põe a imaginar que paradeiro teriam tido na vida os seus
coleguinhas de escola elementar. E aí Allen faz a maldade de mostrar, na sala
de aula, esses coleguinhas, um de cada vez, se levantando da sua carteira
escolar, e pomposamente anunciando o que "é" no futuro. Há
empresários, bombeiros, cafetões, mendigos, marginais...e a cena é tristemente
patética.
No meu caso, os amigos do primário, perdi
a maior parte de vista, porém, os do curso secundário, no Liceu, lembro mais.
Éramos uma turma unida que gostava de
se divertir juntos. Entre nós houve paqueras, namoros, paixões secretas, mas
nunca pela pessoa certa. Nesse aspecto amoroso não tivemos sorte. Quando X
estava a fim de Y, este queria Z... E assim por diante. De forma que, embora
fôssemos rapazes e moças, nunca, de dentro do grupo, saiu um casal.
Pois com a ajuda da internet,
consegui rastrear alguns desses amigos e amigas, justamente os mais ligados a
mim, lá pelos anos sessenta, a saber: João, Teresa, Raimundo, Maria, Joaquim, e
Liliane, que a gente chamava de Lili.
Quem me ajudou nessa pesquisa
sentimental e saudosista foi o amigo Carlos, de quem nunca perdi contato, e com
quem ainda hoje me correspondo.
Contou-me ele que João ainda jovem
fugiu para a América, no encalço de um tio que tinha negócios escusos em Miami.
Foi trabalhar numa locadora de carros, casou com uma coroa americana só pra ter
o green card, separou, e hoje mora em Atlanta, ninguém sabe se bem ou mal
adaptado ao modo de vida dos gringos.
Uma surpresa foi saber que Teresa, a
garota mais extrovertida da turma, sempre sorridente e pra cima, optou pela
vida religiosa e, dizem, vive reclusa num convento de freiras em Minas Gerais,
sem ver ninguém, nem ser vista. Nem a família sabe dela. Quem lembra o seu
sorriso franco e sua alegria não acredita.
Um pouco mais triste teria sido o fim
de Raimundo, que, ainda nos primeiros anos de faculdade, sofreu um acidente de
automóvel numa viagem noturna para Cajazeiras, e veio a falecer. Dizem que
vivia bêbado e que bêbado estava no momento: seu carro foi esmagado por uma
jamanta e nada sobrou. Lembro bem que a notícia saiu nos jornais e os pais,
idosos, nunca se recuperaram do choque.
Difícil foi achar o paradeiro de
Maria, que segundo o meu amigo Carlos nem vestibular fez, nem curso algum, ela
que parecia ser a mais inteligente de nós todos. Com esforço, conseguimos
localizá-la em Paraú, interior do Rio Grande do Norte, sua terra de origem,
onde, solteirona e idosa, vive de dar aulas pra crianças carentes da região.
Uma vidinha miúda, pra ela que, além de inteligente, tinha uma beleza singela
que nem sua timidez escondia.
Mas o caso mais estranho e misterioso
é, com certeza, o de Joaquim, o nosso colega mais "bon vivant" e mais
divertido. Simpático, bonitão, descontraído, filho de pais ricos, tinha, mais
que qualquer um de nós, um futuro brilhante pela frente. Se, aos 23 anos de
idade, não tivesse se matado com um tiro certeiro no peito. O boato é que teria
sido decepção amorosa. Aliás, boato que também foi dito da fuga de João pro
exterior, do isolamento religioso de Teresa, do alcoolismo fatal de Raimundo, e
da solidão de Maria...
Se alguém se deu bem na vida foi
Lili, aquela lourinha cabeça de vento que namorava todo mundo no colégio
inteiro, sem levar ninguém a sério. Nem bonita era, mas era dona de um certo
charme sedutor, e um papo que enganava até os professores mais sisudos. Mais
tarde, esse charme foi usado na conquista de um certo J. Pinto Fernandes,
poderoso empresário cearense, com quem casou e hoje vive posando de madame,
orgulhosa de ser a consorte de um dos construtores da muralha de arranha-céus
que enfeia a orla de Fortaleza.
Enfim, depois de redigir estas
linhas, em dúvida, perguntei a meu amigo Carlos, bem mais sábio que eu, se
devia publicar esta crônica meio triste. Sua resposta: assim é a vida.
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