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Era inicio da década de 70, na minha linda e
multicultural cidade de Cajazeiras, alto sertão paraibano. Um senhor humilde, simpático e espirituoso,
que respondia pela alcunha de “Zé Sozinho”, percorria de bicicleta os
principais bairros da cidade, com um projetor de 16 mm e várias latas de filmes,
e tornava a efeito, em salas improvisadas, um pequeno cinema.
O espaço era literalmente improvisado, com
alguns bancos e caixas de madeiras, onde alguns petizes sentavam-se, quando
não, no próprio chão, muitas vezes de terra batida.
Eu, pessoalmente, levava de casa meu
banquinho de madeira, adrede e esmeradamente, fabricado pelo meu avô, para
ocasião tão especial. A cabine de projeção praticamente não existia. Eram
apenas dois enormes caixões, no meio da sala, um sobre o outro, e um projetor
de 16 mm, já um tanto desgastado pela ação deletéria do tempo, em cima, onde
“Zé Sozinho” manuseava-o, em pé, sobre uma cadeira.
Os gêneros das películas, projetadas,
resumiam-se a clássicos da Cinédia, da Atlântida e títulos internacionais de
aventura, Faroestes e Bíblicos.
Cascavilhando, em minha, já fraca memória,
fatos acontecidos durante essas mágicas e nostálgicas exibições, lembro-me de
um fato marcante e até certo ponto engraçado, ocorrido durante a exibição da
película: TARZAN O REI DA SELVA.
Como “Zé Sozinho” dispunha de apenas um
projetor, quando finalizava o primeiro rolo da película, a exibição era
interrompida, para que ele fizesse a substituição do segundo rolo.
Pois, quando era para ser inserido o segundo
rolo da película em “epígrafe”, “Zé Sozinho” bradou num megafone (confeccionado
de lata de querosene, por seu Joaquim “flandeleiro”):
- “Vocês preferem que eu coloque a segunda
parte de TARZAN O REI DA SELVA, ou a primeira parte de DJANGO VEM PARA MATAR”?
Fiquei, profundamente, triste, quando a
maioria dos guris, optaram pela primeira parte de DJANGO VEM PARA MATAR! Voltei
para casa, decepcionado, e demorei a dormir nessa noite, indagando a mim mesmo,
“como pode eles optar pela primeira parte de um outro filme, já que ficaremos
com dois filmes inconclusos, em nossas mentes”?
Confesso que foi o único desalento que tive
de “Zé Sozinho”, pois as películas que tive a oportunidade de assistir
posteriormente, inteiras, vale ressaltar, foram excepcionalmente significativas
para um pré-adolescente, com o cérebro em ebulição, que acabara de se encantar
pela SÉTIMA ARTE, a exemplo de: SALUTE TO THE MARINES (não me lembro do nome em
português), ESPARTACUS, LAWRENCE DA ARÁBIA, CLEÓPATRA, ERA UMA VEZ NO OESTE, A
CONQUISTA DO OESTE, DOUTOR JIVAGO, BEM-HUR, e muitos outros épicos americanos,
em que minha memória, já desgastada pela ação do tempo, não permite lembrar.
Hoje, aqui sentado, numa confortável
poltrona, numa luxuosa sala de exibição, de um ostentoso SHOPPING CENTER, onde
tive o “insight” de escrever esta crônica, eu pergunto, a mim mesmo: - “Por que, aqui não sinto a atmosfera mágica
e encantadora que sentia, quando na minha pré-adolescência, sentado em meu
banquinho de madeira, assistia as exibições cinematográficas de Zé Sozinho?”.
Uma voz, serena e de tom poético, saindo do
meu subconsciente, responde:
- “Fernando, Zé Sozinho, não apenas,
projetava películas, ele projetava sonhos, especificamente, o sonho dele mesmo,
quando decidiu perambular, pela estrada da vida, a levar arte e encantamento
pelas bibocas de um sertão tão inóspito, que para a maioria das pessoas, apenas
sobreviver, já é ter vencido uma grande batalha”.
Ao que “meu eu” consciente, responde:
- “Verdade, Zé Sozinho projetava sonhos!”
Mas, não apenas projetava, ele realizava sonhos.
“Como realizou o meu sonho, de ser ator
coadjuvante, na vida real, no meu CINEMA PARADISO, nos meus tempos felizes de
menino”.
João Pessoa
16 de maio
de 2016
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