Francisco Sales Cartaxo
Filho de agricultor pobre, Alfredo Ricardo
do Nascimento nasceu em Cajazeiras em 1908. Ainda criança, perdeu o pai. Quando
ele estava no começo da adolescência o pai morreu. Viveu, então, em casas de
parentes, aqui e acolá. Sempre trabalhando, na roça ou na rua, mal frequentou a
escola do professor Crispim Coelho. Acolhido por dom Moisés e padre Gervásio
Coelho, no Colégio Diocesano, trabalhava mais do que aprendia as primeiras letras
com um bedel.
Irrequieto, corajoso, aventureiro,
Alfredo resolveu cair no mundo. Na companhia do tangerino Raimundo Anacleto,
tangeu tropas de burros pelos sertões. Brigou e, de volta a Cajazeiras,
encostou-se no seu padrinho, coronel Guimarães, que lhe deu um jumento, uma
cangalha e quatro latas de vinte litros. Com isso, abastecia a casa do sogro do
juiz Victor Jurema e vendia água de beber, nas ruas de Cajazeiras.
No segundo arroubo aventureiro foi
parar no Rio, via Fortaleza, onde se alistou no Exército para servir na capital
da República. Na caserna, virou enfermeiro, conheceu muita gente, ampliou seu
relacionamento num mundo desconhecido. Mais tarde, isso lhe abriu porta para
sair de sua medíocre vida suburbana, e permitir que Alfredo começasse a tomar o
rumo que o tornaria artista, numa época em que da Bahia para cima tudo era o
Norte.
- Qual é o seu nome?
- Era João Joca, mas agora será Zé do
Norte.
- Qual foi à primeira estação de
rádio que você cantou lá no Norte?
- Nenhuma, estou no Rio desde 1926.
- Por que Zé do Norte?
- Porque Zé é povo, e quero
representar o povo do Norte, cantando as músicas de lá.
Esse diálogo, transcrito do livro
Memórias de Zé do Norte (Rio, 1985), foi travado em 1939 com Manoel Barcelos,
locutor da Rádio Tupi, do Rio, depois que Zé do Norte cantou pela primeira vez
numa emissora de rádio. Assim começou a vida artística do cajazeirense. Cheia
de peripécias, sinuosidades, aventuras, sucessos e fracassos, trapalhadas e
andanças por várias emissoras de rádio Rio, onde cantava, recitava poesias,
narrava casos, divulgava o folclore das terras de cá, no comando de programas
dedicados à zona rural e às periferias de grandes cidades.
Tempo áureo do rádio!
Em 1948, publicou seu primeiro livro
de folclore, Brasil Sertanejo, e poucos anos depois teve seu nome consagrado
como compositor, na esteira do premiado filme O cangaceiro, de Lima Barreto,
por meio de músicas como Mulher rendeira, Lua bonita, Meu pião. Composições que
lhe deram aborrecimento, intrigas e encrencas judiciais, mas também o levaram à
fama e à grana dos direitos autorais. Antes disso, tentou, sem sucesso, ser
vereador no Rio, pelo Partido Social Trabalhista.
Tudo isso e muito mais está escrito
em linguagem simples, feito conversa de botequim, entremeada de poemas,
narrativas de casos vividos pelo povo e muita aventura, incluindo viagem pela
região do Araguaia, nos estados de Goiás e Mato Grosso, onde esteve garimpando
material para registrar o folclore daquela área inóspita. Difícil separar no
texto o real do imaginário. O memorialismo tem essa faceta, imagine quando abrigado
num espírito irrequieto, buliçoso, aventureiro, como foi o de Zé do Norte.
.........................................................................................................................
Alfredo Ricardo do Nascimento, Zé do
Norte, é Patrono da Academia Cajazeirense de Artes e Letras (ACAL), Cadeira nº
2, cujo primeiro ocupante é Aguinaldo Rolim.
Nenhum comentário:
Postar um comentário