Silvio Osias
No
dia 15 de março de 1990, ao tomar posse como primeiro presidente eleito depois
do golpe de 64, Fernando Collor, numa canetada só, acabou com o cinema
brasileiro.
O
homem da cultura no novo governo era o paraibano Ipojuca Pontes.
Ipojuca
Pontes envergonha a Paraíba.
Ipojuca
Pontes envergonha o cinema brasileiro.
Bem,
como sabemos, Collor foi derrubado, e aí vieram Itamar e FHC e Lula, etc.
O
cinema brasileiro renasceu. Foi renascendo.
Primeiro,
falava-se em retomada. Cinema da retomada. Depois, a expressão ficou para trás.
A
recuperação foi notável!
Novos
diretores. Muitas mulheres dirigindo. Produções voltadas para plateias - digamos -mais exigentes. Outras destinadas essencialmente ao - tão importante - êxito comercial. Documentários, cinebiografias. Diálogo com a televisão.
Prêmios internacionais, presença no Oscar (a Fernanda Montenegro de Central do
Brasil). O Nordeste (Pernambuco, Paraíba, Ceará) dentro desse cenário. Ancine,
Petrobrás. Qualidade e quantidade.
Tudo
isso em 25 anos.
Agora,
em 2019, um governo de extrema direita expressa o desejo de impor grandes
restrições à produção brasileira de audiovisual. Não é papo de esquerdista. É o
que tem sido dito e feito pelo governo do presidente Bolsonaro.
Adota-se,
então, uma outra expressão. Cinema de resistência.
Bacurau,
que estreia nesta quinta-feira (29) nas salas brasileiras, é um grande
acontecimento político e estético e, por excelência, um exemplo disso que a
gente está chamando de cinema de resistência.
Dirigido
por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, Bacurau é cinema à altura do
melhor cinema que se faz atualmente em qualquer lugar do mundo.
Acompanho
Kleber Mendonça desde o tempo em que ele fazia crítica de cinema no velho
Jornal do Comercio, onde, no passado, a gente lia Celso Marconi.
Depois,
vieram os filmes de curta metragem (Vinil Verde, Recife Frio) e a fabulosa
estreia no longa com O Som ao Redor.
Claro
que havia a pergunta. Kleber conseguirá repetir o êxito de O Som ao Redor?
E,
aí, veio Aquarius a mostrar que sim.
E,
agora, Bacurau.
Ali
no Recife, o Recife onde vi tantos filmes e tantos shows, o Recife das
livrarias e das lojas de discos, ali no Recife, tão real porque tão perto de
nós, surgiu esse cara a fazer justiça ao passado do cinema brasileiro e a
dizer, com seus filmes, como é o presente e como pode ser o futuro.
Kleber
honra a linhagem dos que migraram da crítica para a realização. Como François
Truffaut - o primeiro nome que sempre me ocorre.
Kleber
foi crítico, é cinéfilo e sabe tudo do seu ofício - ser cineasta, escrever e
dirigir filmes.
Já
escrevi aqui mesmo sobre Bacurau:
É
filme realizado por quem pensa o cinema. A habilíssima manipulação dos gêneros,
a construção de climas, a tensão permanente, o uso de trilhas preexistentes, o
diálogo com o passado (do cinema) e a rara capacidade de atualizá-lo - tudo
junto e misturado para levar o espectador à catarse final.
Bacurau
é um grande filme. Daqueles aos quais a gente dá cinco estrelas. Como Inácio
Araújo deu, na Folha.
Kleber
Mendonça Filho é o maior nome do novo cinema brasileiro.
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