Ex-prefeito
de Cajazeiras, Otacílio Jurema
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Nos idos de 1954, era prefeito de Cajazeiras, o médico Otacílio Jurema, solteirão, que apreciava fazer visitas noturnas aos “inferninhos” da cidade.
Dom Zacarias Rolim de Moura,
Bispo da Diocese de Cajazeiras, sempre gostou da presença do frade capuchinho
Frei Damião de Bosano na cidade de Cajazeiras para pregar as santas missões.
Verdadeiras multidões
acompanhavam silenciosamente as suas palavras vibrantes e fortes,
principalmente quando ele falava sobre as raparigas e os amancebados e a cada
vez que Frei Damião vinha à cidade, muitos casais amasiados se casavam na Santa
Madre Igreja, dezenas abandonavam o protestantismo e milhares de pessoas faziam
confissões e participavam de suas caminhadas nas madrugadas pelas ruas da
cidade.
Numa destas visitas de Frei
Damião a Cajazeiras, o frade, do púlpito, instalado no patamar da Igreja Matriz
de Nossa Senhora de Fátima, deu um ultimato a Otacílio Jurema e a cidade de
Cajazeiras: “só volto aqui quando retirarem o cabaré que fica atrás do
Cemitério Coração de Maria”.
Mal o frade terminou o
sermão, as beatas, as mulheres de vida livre, os “homens diferentes”, os
vicentinos, os padres, os vereadores, os outros políticos, as mocinhas
candidatas à miss, a turma do vuco-vuco, as próprias mariposas do cabaré do
cemitério e o povão em geral se entreolharam espantados. E agora, onde é que
Dr. Otacílio vai colocar o cabaré?
No dia seguinte uma comitiva
já estava a postos, pastorando a passagem do prefeito, no seu diário passeio,
entre a sua residência, na Rua Dr. Victor Jurema e a Rua Padre José Tomaz,
onde, na porta do mercado central, José de Sousa, engraxava seus sapatos todos
os dias e em torno deles ficavam os seus “assessores” informando-lhe das
novidades.
Dr. Otacílio que nunca foi de
ir a igreja rezar (dizem que ele não casou com medo de entrar numa igreja), não
tinha ouvido o sermão da noite anterior proferido por Frei Damião, mas já havia
sido informado na mesma noite, por um correligionário.
Otacílio estava entre a cruz
e a espada. Não podia privar o povo religioso de Cajazeiras da palavra de Frei
Damião e se encontrava à frente de um dilema, já que não queria “desgostar as
meninas”, que ele tanto conhecia e queria bem. Na prefeitura, reuniu os amigos
e recebeu uma comitiva tendo a frente as dirigentes da poderosa Liga Feminina
Católica de Cajazeiras. Colocaram o problema para Otacílio e deram um tempo ao
mesmo para uma solução.
Nesta mesma noite Otacílio
fez uma visita ao Cabaré que ficava atrás do cemitério, conhecido também como
“ferro de engomar”. No salão rolava uma dança, uns bebiam num balcão, outros em
mesas e o sanfoneiro tocava um xote gostoso de dançar. Quando o prefeito pôs o
pé no salão, todos pararam e logo queriam uma resposta do mesmo a respeito do
ultimato de Frei Damião.
Otacílio com sua tradicional
cortesia e educação, sentou-se num tamborete e começou a ouvir as opiniões e lá
no canto do salão estava a veterana das raparigas de Cajazeiras, a velha Baroa,
que deve ter “iniciado” na vida pregressa, a metade dos meninos da cidade, só
ouvia. Foi quando Otacílio pediu a sua opinião. E ela sem pestanejar soltou o
verbo: a mercadoria que nós vendemos ela é procurada em qualquer lugar. Tanto
faz ser aqui atrás do cemitério ou na frente da prefeitura, os homens vem atrás
de nós. Valeu a palavra de Baroa e Otacílio saiu mais aliviado, porque as mais
novas e bonitas não queriam ficar tão longe do centro da cidade, porque nem
todos tinham carro, se o bordel ficasse longe. Algumas já pensavam até em fazer
uma greve de sexo contra os correligionários do prefeito e até contra o mesmo.
Uma conspiração se instalava no centro nervoso da cidade.
Pouco tempo depois Otacílio
comprou um terreno, ao sudeste da cidade, que ficou conhecido como “a palha”,
construiu moradias para todas as mulheres, fez um enorme salão para dança, um
bar e pequenos quartos para aquelas que não tiveram “direito” as casas e Lilia
era quem comandava uma parte da turma e o salão.
Logo que tomou conhecimento
da atitude do prefeito, Frei Damião voltou a Cajazeiras e fez uma procissão do
Cemitério Coração de Maria até a frente da “Palha”, onde instalou um cruzeiro
em cima de uma pedra, que foi batizada de “Pedra do Galo”, rezou e celebrou uma
missa e rogou aos céus para que aquelas “infelizes mulheres” deixassem a vida
da prostituição.
Outro dia relembrando este
fato com um velho amigo, ele saiu com esta: se fosse hoje estava difícil de
Frei Damião andar em Cajazeiras, porque em cada esquina existe um “inferninho”.
Haja reza. Enquanto isto, as mariposas circulam livremente pelas ruas de nossa
cidade, fato que não acontecia na década de 50, porque estas mulheres eram
discriminadas pela sociedade e principalmente pela Liga Católica Feminina. A
história registra ser a prostituição uma das mais antigas profissões do mundo,
não reconhecida. Hoje só saudades do querido e inesquecível Frei Damião. Quando
ele vinha a Cajazeiras, a cidade pecava bem menos e até as “meninas” de Lilia
cruzavam as pernas.
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