terça-feira, 8 de dezembro de 2015

MEMÓRIAS DO MEU CINEMA PARADISO

por Cleudimar Ferreira




Sempre foi apaixonado por cinema. E essa paixão não troca por nada. A imagem do garoto dirigido por Giuseppe Tornatore me faz voltar no tempo em que eu era um biscateiro nos lixos dos cinemas de Cajazeiras. Sempre a procura de um pedaço de fita de cinema e alguns fotogramas de filmes de faroeste - os meus preferidos. Usava esses restos de películas para brincar de cinema com os meninos da minha rua. Se pudesse voltar a esse tempo, faria tudo de novo. Depois, o contato natural com esse ambiente cinéfilo foi estreitando a minha amizade com os funcionários nas salas de projeção e assim acabei me tornando amigo dos operadores de projetores dos Cines Teatro Apolo XI e Pax.

Ai tudo ficou mais fácil. Tornei-me também mais tarde auxiliar de projeção desses cinemas. Aprendi a revisar os enormes rolos de fitas e depois passei a operar os projetores. Auxiliei muitas vezes os titulares dessa função, nesses cinemas, sem ganhar um centavo, só pelo prazer que sentia em está no cinema e pela magia que esse encantava meus olhos.

Grandes produções assisti. Ajudei a operar aquelas imensas máquinas. Em outra fase dessa minha afinidade com os cinemas de Cajazeiras, foi quando passei a dividir a programação de rua com o titular dessa função. Uma atividade em que para mim era a melhor de todas. Pois costumeiramente, um dia na semana, eu ia a Rodoviária com Cícero Alves (o Cícero do Bradesco) in memoriam, buscar os latões de filmes que vinham de ônibus do Recife. Para mim às quartas-feiras - dia em que os filmes chegavam da capital pernambucana, era o melhor dia da semana.

Ficava apreensivo, esperando abrir os latões para ver os cartazes, as fotografias e os rolos de fitas. Depois me deslocava com Cícero até uma das salas do Cine Pax para confeccionar as tabuletas com os cartazes dos filmes do dia, que eram colocadas na Praça João Pessoa com a Rua Padre José Tomaz e Estação Rodoviária. Como eu era para Cícero um excelente letrista, essa atividade era praticamente feita por mim.

Tempos depois veio o Cinema Novo. Nesse período, passei a integrar a equipe do Cineclube Vladimir Carvalho, num período em que o mesmo estava praticamente fechado. Mas como o tempo não é eterno e junto com ele tudo passa, como passa nossas vidas. Essa fase com a decadência do Cineclube me trouxe mais experiência e bem mais afirmação cultural. Atributos essenciais para a minha formação política e definição ideológica.

Foi um tempo bom. Aprendi mais a ser questionador e crítico do meu tempo, e entender que a decadência do Cineclube não era empecilho para nos desanimar. Eu e Eugênio Alencar - hoje professor da rede municipal de ensino de Cajazeiras, colocamos dois projetores de 16 mm doados pelo Instituto Gehts Alemã do Recife, em um carrinho de mão e saímos às noites pelos bairros, associação de moradores e sindicatos da minha querida Cajazeiras, exibindo documentários de graça para as pessoas interessadas nesse tipo de cinema.

Uma cópia do documentário "O que eu conto do sertão é isso", doada ao cine clube por Romero Azevedo, um dos produtores do filme, foi a película que a gente mais rodou nas fachadas das residências dos bairros de Cajazeiras. Lembro que depois de cada seção, havia sempre debates com discussões e questionamentos a respeito dos filmes que eram exibidos para comunidade.

Com o passar do tempo, hoje as lembranças desse passado, enciste em deixar e fugir da minha memória de 55 anos. Mas para prendê-las dentro de mim, sonho quase todas as noites com esse Cinema Paradiso que passou, levando com ele um pouco da minha adolescência e da paixão pelo cinema da minha terra, que envelheceu e quase já não existe mais.




créditos das imagens:
1- Philippe Noiret e Salvatore Cáscio em "Cinema Paradiso"
2- John Weyne em "Rastro de Ódio"
3- Cartaz de divulgação do Cine Éden na Praça João Pessoa.
4- Prédio onde funcionou o Cine Teatro Apolo XI

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