terça-feira, 30 de dezembro de 2014

O Cangaceiro Sabino em Cajazeiras (O Herói)


por: Marilda Sobreira RolimJornal "O Norte" , edição: dezembro/1996.


Marilda Sobreira Rolim - Escritora


"O cangaceiro é considerado um injustiçado. Mas eu pergunto qual foi o crime cometido pela justiça por não tê-lo julgado?"

"O que os cangaceiros fizeram foi juntar um número considerável de homens que não queriam trabalhar e que saíam tomando para se manter. Chegando a ocasião, naturalmente matavam, estupravam e assim iam de um Estado para o outro, sempre a cavalo. Para eles, a lei era o fuzil. Chegavam a uma propriedade com toda autoridade de dono, e se alguém não obedecia ali ficava no chão, “comendo terra”, como diziam."

Sabino cangaceiro (foto), quando imaginou atacar Cajazeiras, convidou Lampião, que respondeu: “O Padre Cícero me passou ordem de nunca ir a Cajazeiras, porque ele foi aluno do Padre Rolim e não queria vê-lo sofrer”... Então o cangaceiro Sabino foi sem Lampião.

Sabino Cangaceiro
Para o místico D. Moysés Coelho, foi uma noite de aflição. O Colégio Padre Rolim ficou cheio de famílias que queriam ficar à sombra do pastor, que só fazia rezar e pedir a todos que tivessem calma, que Deus tudo resolveria.

A cidade sem nenhuma defesa, os cajazeirenses pacatos e confiantes não acreditavam que o bando tivesse ousadia: atacar Cajazeiras!

Os poucos soldados foram para São João do Rio do Peixe. Os homens que armas ainda deram uns tiros à toa, Marechal Sobreira Cartaxo, Romeu Cruz, e Raimundo Anastácio.

A tardinha o grupo chegou. Logo na entrada da cidade matou dois agricultores, um soldado e um paralítico, que, na sua ingenuidade, gritou enaltecendo os "heróis”. A casa dos Barbosa, na Rua Dr. Coelho, foi incendiada, nunca se soube o motivo.

Sempre atirando e gritando, iam em direção à casa do Major Epifânio Sobreira Rolim (foto, onde hoje funciona a Secretaria Municipal de Educação). O Major, muito calmo, de fuzil na mão, brincando, dissera para sua esposa dona Terezinha: “Tanta munição e eu não dou nenhum tiro” Nisso ouviu se as pisadas dos homens rodeando a casa. Tomaram seus lugares e tudo começou. Tanto atiravam como gritavam: “vamos te pegar, velho, te prender de cabeça para baixo e furar tua garganta, como se faz com um bicho”.

Casa (alvo do ataque) do Major Epifânio Sobreira Rolim 

A família toda dentro de um quarto, crianças, moças, filhos adotivos, ao todo dezoito pessoas A porta da frente que dava para o jardim foi aberta a coice de rifle A trave caiu; a pancada no assoalho juntou-se ao som do ferro de zincado. Até o piano ressoou. A dor na nossa cabeça uniu se ao medo; a oração ficou paralisada na garganta. Ouvíamos os gritos dos bandidos ''venham que tem uma porta aberta. ‘Vamos pegar o velho “na unha"

A porta aberta do casarão guardava a família do major, num grande desafio. O lutador não teve calma foi até o meio da sala, atirou e voltou baleado. No mesmo instante chegou o vaqueiro José Inácio, homem rústico e de tremendos bons sentimentos. Foi um amigão para o patrão. A experiente e desvelada esposa que orientava o major no combate, mudando de armas para confundir, notou que ele estava manquejando e baleado.

Cheia de ansiedade pediu ao esposo para saírem, mostrando lhes os perigos. Depois de muita insistência ele cedeu. Nesse momento ouvimos um tiroteio estranho. Era o motor da luz, causado por falta de água. Os cangaceiros, pensando ser reforço, se retiraram. Isso foi ideia de José Sinfrônio.

A nossa saída foi perigosa, mas deixou o alívio de ver o plano do cangaceiro Sabino não ser realizado, que era levar o major preso, de porta a fora, para conseguir dinheiro dos parentes e amigos. Já imaginaram que humilhação? Voltaram os bandidos cabisbaixos, sem o som dos gritos da vitória nem o eco das risadas, somente levando nos ombros a derrota aumentada pelo medo.

Marilda Sobreira Rolim:

"Relembrando fatos do passado, eu vejo o testemunho de minha história e, nessa vida em pedaços, lamento o conceito sobre o que é ser herói."

"Pedir aplausos para esses figurados heróis, que foram no passado o desassossego dos velhos e crianças, a aflição dos necessitados e o terror do Nordeste? Isso, jovens, não é ser herói!"

"Quando os nomes de Luiz Padre, Lampião ou Sabino eram pronunciados, o silêncio era ouvido, a alegria fugia e o medo envolvem aqueles que pensavam em seus familiares."



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