Por Francisco Frassales Cartaxo
O poeta Cristiano Cartaxo concluiu o curso de Farmácia no
Rio de Janeiro, em 1913. Um século! Ele começara os estudos de medicina na
pioneira faculdade da Bahia, mas logo se transferiu para o Rio. Seu pai, o
major Higino Rolim, dono de farmácia autorizada a funcionar pelo Imperador
Pedro II, em 1875, induziu o filho a mudar de curso e, com isso, antecipar o
retorno a Cajazeiras, a fim reforçar o prestígio da sua botica. Foi o que se
deu. Cristiano Cartaxo chegou às vésperas da criação da diocese, quando o padre
Sabino Coelho arrecadava fundos para garantir a formação do patrimônio da
futura diocese. Nessa época, o Ceará pegava fogo com a sedição do Juazeiro. Sob
as benções do padre Cícero Romão Batista, os jagunços comandados pelo médico e
deputado federal, Floro Bartolomeu, puseram a correr do governo cearense o
coronel do Exército, Franco Rabelo, que fora eleito graças ao “salvacionismo”,
movimento responsável, no Ceará, pela derrocada da oligarquia Acioly. O
episódio teve dimensão nacional, mercê das ligações partidárias do padre Cícero
e Floro com Pinheiro Machado, o poderoso chefe nacional do Partido Republicano
Conservador.
Pois bem, foi esse contexto agitado que meu pai encontrou
neste pedaço do Brasil, ao retornar a Cajazeiras. No plano sentimental,
contudo, predominava céu de brigadeiro. Seu casamento já estava acertado com
Idalina, filha mais nova do coronel Joaquim Matos. Dizem que Ilina era uma
linda mulher. Os retratos, guardados a sete chaves, confirmam a beleza da
primeira esposa de meu pai. O enlace durou pouco. Alguns anos apenas. Ilina
Matos morreu em trabalho de parto do segundo filho.
Viúvo rico para o padrão da época, anel no dedo, quando
sequer havia médico em Cajazeiras, Cristiano deve ter sido observado com olho
comprido pelas donzelas... E pelos pais delas... Isso ele deu a entender em
raríssimas confidências e, assim mesmo, em doses homeopáticas. Quem o seduziu
então? A beleza de uma adolescente expulsa do Cariri, junto com sua família,
pela sanha repressiva dos fanáticos do padre Cícero. Veja o leitor, como fatos
históricos influenciam manifestações individuais de paixão e de amor.
Marilda Sobreira, prima legítima do meu pai, chamava o major
Higino Rolim de “tio doutor”. Por quê? Porque o tio era farmacêutico prático,
como se dizia. Aviava receitas com base em compêndios franceses. Todos o
tratavam como doutor. Imagine a importância do filho, formado no Rio, jovem,
poeta, culto, orador em festas cívicas e religiosas... Católico, Cristiano caiu
nas graças de dom Moisés Coelho, nosso primeiro bispo, a partir de 1915, tanto
que mereceu largos elogios do padre Heliodoro Pires, em carta publicada em
1916, em jornal da capital da Parahyba.
No centenário de sua formatura, presto a meu pai
esta homenagem simples, despida de excessos laudatórios e prometo para breve
narrar uma história de amor ocorrida em Cajazeiras, na qual ele é protagonista.
História de amor com raiz na chamada “guerra” entre Crato e Juazeiro. Por
coincidência, guerra iniciada, exatamente, no mês de dezembro de 1913, quando o
poeta Cristiano Cartaxo Sobreira Rolim concluiu o curso de Farmácia, no Rio de
Janeiro.
fonte: blog setecandeeiros cajá
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