.......................................................................................................... Mariana Moreira
Um
primo situado entre meus minguados leitores diz que gosta de meus
escritos, sobretudo, quando trago como mote situações e causos
vividos na minha infância e adolescência, em Impueiras. Confesso
que registrar um pouco esse período me dá uma imensa satisfação.
Talvez esse seja meu estilo. Desculpem-me a pretensão. Falar de
lembranças, momentos prazerosos vividos na infância e adolescência
me inspira.
Como
não se deleitar com as reminiscências das bocas de noites em que
primos e compadres de meus pais nos visitavam na luz bruxuleante das
lamparinas de querosene que projetavam sombras e davam materialidade
aos causos de almas penadas, visagens, viagens fantásticas, parentes
que arribavam nas secas e que surgiam nas cartas mal escritas que
papai lia na sala de nossa casa entre murmúrios e lágrimas de
saudades e sonhos de um lugar distante e diferente do sertão marcado
pelos seus contrastes de secas e pujança das invernadas.
Como
não ter prazer em lembrar o cheiro da terra molhada nas primeiras
enxurradas e nos tampos de terra que rompiam com a força da babugem
que vestia de verde os campos e roçados. A alegria de colher a água
da chuva nas biqueiras da casa e usufruir mais tempo para
brincadeiras uma vez que não teríamos que abastecer a casa com a
água das cacimbas que, à medida que avançava o período de
estiagem, ia se aprofundando em degraus vencidos com nossa força de
crianças se equilibrando na lama formada pelos furos das surradas
latas de querosene Jacaré transformadas em vasilhame para o
transporte do líquido.
Como
não ter o sabor da cana caiana descascada e degustada a sombra das
frondosas mangueiras jasmin. Roletes que eram consumidos com o
apetite despertado no intervalo entre as obrigações de casa e de
ajuda nos afazeres domésticos e escolares e que deixavam marcados em
braços e barrigas os vincos da garapa que escorria de nossas bocas
inocentes. Como não reviver o gosto dos canapus, dos trapiás, dos
oitis, dos jenipapos, das azeitonas, dos cajus colhidos nas aventuras
de subir na árvore sem os limites do perigo. Do assar das castanhas
e das brincadeiras de bitelo. Dos banhos de açudes e riachos na
aprendizagem do nado com os cavaletes de tronco de bananeira. Das
moagens no engenho da Coréia com o cheiro impregnado do velho motor
a diesel, do sabor dos alfenins, das rapas de gamela, da prosa solta
dos trabalhadores e cambiteiros, dos vôos das abelhas de arapuá na
festa em torno das colunas de rapadura.
São
episódios que, perdidos na poeira do tempo, ressurgem como seiva que
alimenta a vida e mantém acesa a capacidade de sonhar e acreditar
que, como as lembranças da infância e adolescência, hoje ainda
podemos construir outros reinos, possíveis ou encantados, como
encantados eram os reinados que Dona Elvira Paulo assegurava existir
nas rugas do Serrote do Quati.
Mariana Moreira - é Carrazeirense da gema do Sítio Cipó, professora,
radialista, jornalista... e um montão de coisas Boas!
Fonte: ac2brasilia
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