Era filho do boticário Higino
Gonçalves Sobreira Rolim e de Ana Antônia do Couto Cartaxo (Mãe Nanzinha),
descende das famílias fundadoras de Cajazeiras - Albuquerques, Rolins e
Cartaxos. Iniciou seus primeiros estudos em sua própria terra natal. Mais tarde deu continuidade, cursando
sucessivamente as Faculdades de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro, em busca
de um diploma de farmacêutico, conquistando-o, afinal, em 1913.
Regressando a cidade de
Cajazeiras, dedicou-se às atividades de sua profissão, dirigindo, por muitos
anos, a tradicional farmácia que herdou do pai.
Sentiu o gosto de ter participado da vida pública cajazeirense como
Vereador, Vice-Prefeito e Prefeito Municipal.
Nome dos mais expressivos dos
meios intelectuais da Paraíba, não quis, por exagerada modéstia, ocupar uma das
cadeiras da Academia Paraibana de Letras, quando convidado pelo saudoso
beletrista Cônego Matias Freire.
A sua vasta e excelente
produção poética andavam esparsas pelos jornais e revistas da Paraíba e do
Ceará até que seu genro, Mozart Soriano Aderaldo, lembrou-se de reuni-la ao
ensejo das comemorações de seus 70 anos. Posteriormente, após sua morte, seus
familiares publicaram um 2º livro: A Musa Quase Toda. O poeta faleceu de parada
cardíaca no dia 29 de agosto de 1975, aos 88, totalmente lúcido. Cristiano
Cartaxo respirava poesia e seus poemas recendiam a amor.
casa onde residiu o poeta Cristiano Cartaxo |
o casal: Dona Isabel (esposa) e Cristiano Cartaxo. |
Poesias de Cristiano Cartaxo
O Amor aos Seus
..............................................................................
Só Você
Para sua esposa, Isabel.
Hoje estou com saudade de
você,
Isabel, muito mais que de
costume.
Saudade que traduz e que
resume
todo esse amor que sinto por
você.
Ninguém sabe melhor do que
você
quanto esse enlevo de
minh’alma assume
a expressão inefável de um
perfume
toda vez que estou longe de
você.
A distância é fator por
excelência
a ativar, avivar-me a
consciência
de que não preso a vida sem
você,
donde me vem a convicção mais
forte
de que só, intrusa e má, a
morte
poderá separar-me de você.
Conselhos
A vida é um manso lago
azul
Júlio Salusse. A meus filhos.
Que Deus proteja sempre o
nosso lar.
Nunca permita se lhe altere o
aspecto
E assim possamos, sob o mesmo
tecto,
à flor das águas mansas
velejar.
Que não venha dos fados,
insurrecto,
o vento a paz do lago
perturbar.
Envolva-o sempre esse clarão
de luar,
esse ar a’um tempo alegre e circunspecto.
Se, em cumprimento à lei
divina e eterna,
um dos cisnes houver por bem
deixar
as doces águas da mansão
paterna,
floresça o amor no mesmo clima
e estilo,
com o mesmo encanto antigo e
singular,
na paisagem de um lago azul, tranqüilo.
Conselhos 2
Vem cá, meu filho, escuta: não te iludas
com as futilidades deste mundo.
Dá-me o prazer de ver que tu te escudas
no amor de Deus, altíssimo e profundo.
Procura os bons. Foge ao contacto
imundo
dos
maus. Evita os ósculos dos judas:
a beleza e a verdade estão no fundo
das almas simples, das grandezas
mudas.
Cuidado com a miragem dos caminhos!
Evita aqueles que ostentarem flores
e segue aqueles em que houver espinhos.
Fecha os olhos aos pérfidos fulgores
e os ouvidos aos falsos burburinhos:
Deus te acompanhará por onde fores.
O Amor a Cajazeiras
...............................................................................
Cajazeiras
Spondias
Lutea
Majestosa expressão
da flora sertaneja,
formosa afirmação da vida vegetal,
olhos não ponho em ti que, em frêmitos, não veja
fulgir a tradição do meu torrão natal.
formosa afirmação da vida vegetal,
olhos não ponho em ti que, em frêmitos, não veja
fulgir a tradição do meu torrão natal.
E - transpondo os
umbrais de solitária igreja,
ante o altar genuflexo o crente fica - tal
me quedo ante o teu vulto, a alma a sentir que voeja
por sobre a romaria em ronda festival.
ante o altar genuflexo o crente fica - tal
me quedo ante o teu vulto, a alma a sentir que voeja
por sobre a romaria em ronda festival.
Bendito o afã com
que vão as tuas raízes
seiva buscar no chão! Benditos os matizes
da folhagem, de verde aberto a verde gázeo,
seiva buscar no chão! Benditos os matizes
da folhagem, de verde aberto a verde gázeo,
e a força
vegetal que os teus frutos adoira!
Frutos!. Jalde colar de bagas de topázio
que a luz do luar prateia e a luz do sol redoira
Frutos!. Jalde colar de bagas de topázio
que a luz do luar prateia e a luz do sol redoira
Cajazeiras - Cidade
Contra um projeto que queria mudar o nome
da cidade, para o indígena “taperibá”
Minha terra natal é Cajazeiras!
Demora em suave depressão de vale.
Entre as irmãs talvez nenhuma a iguale
no recato do porte e das maneiras.
Dizer de suas graças feiticeiras,
nem é preciso que meu verso fale;
basta que em coro uníssono o propale
a multidão das aves cantadeiras.
O seu nome é um presente do passado.
Vem do berço. Que espírito profano
não lhe arranque o topônimo sagrado,
para que eu possa, em loas verdadeiras,
sempre dizer, envaidecido e ufano:
Minha terra natal é Cajazeiras!
O Amor ao Sertão e ao Nordeste
...............................................................................
Orgulho Caboclo
Tenho orgulho de
haver nascido no sertão,
na terra em que o
vaqueiro, intrépido, se estriba
no dorso de um
cavalo, e de um soco derriba
no coração da mata
o touro barbatão.
Tenho orgulho de
ser filho da Paraíba,
irmão do cearense
indômito, que não
perdeu o amor à
terra e só daqui arriba,
quando na seca os
céus lhe negam água e pão.
Orgulho deste sol,
cujos beijos ardentes
dão à terra
molhada e igualmente às sementes
o mágico poder de
uma ressurreição.
Dos que fecham com
ferro e com cimento e terra
as gargantas do
rio, os boqueirões de serra,
conquistando
destarte a nossa redenção!
Nuvem
Gotas de suor da terra
evaporadas
ao calor, e ao soprar das
ventanias,
amarguras dos campos
condensadas
rumo dos céus, lá nas
alturas frias!
Para onde vais, fugindo
assim às pressas,
tu que és filha daqui?
Não te comove
o aspecto bruto, o horror
medonho dessas
regiões em que há seis
meses que não chove?
Peregrina, mimosa
retirante,
nômade filha do sertão
agreste,
pois é fado viver assim
errante
quem nasceu nessas bandas
do Nordeste?
Reclamam-te esses campos
inditosos
a umidade fecunda dos
teus beijos
na saudade dos rústicos
festejos:
águas de enchentes, roças
e outros gozos.
Nuvem - gases do vale,
véus da serra -
para onde vais, fugindo
assim em bando?
Filha rebelde e pródiga
da terra,
quando é que um dia hás
de voltar chorando?
O chão, o céu, os
pássaros em coro,
rios, açudes, tudo mais
enfim,
ressuscita à harmonia do
teu choro.
O próprio sol se ameiga
ao ver-te assim.
E cala o filho do sertão
adusto,
que desde o berço até à
campa sofre
a dor que lhe arranquei
do peito angusto
e aqui fica gemendo nessa
estrofe:
Ai! Para que plantar? Só
para a mágoa
de assistir o espetáculo
tremendo
de o que plantei aos
poucos ir morrendo
à fartura de sol e à
mingua d'água?
Nuvem, piedade! Ao menos
com o manto
de tuas sombras cobre os
sertões nus
para que o sol não queime
a terra tanto
e o homem não viva
amaldiçoando a luz!...
O Amor a Vida
................................................................................
Pôr do Sol
Que queres tu,
viajor, olhando para trás?
O que vês é a distância, é a estrada percorrida, é o pó das ilusões da vida já vivida, é o tempo que passou e que não volta mais.
Porventura não
vês, após tamanha lida,
que tudo neste mundo é efêmero e falaz? Inexoravelmente, um dia, zás, a morte sorrateira, sutil, corta o fio da vida.
Que queres mais,
viajor, ó espírito enfermo?
Não vês que longe vais, quão perto estás do termo? De que valem as cãs que te ornam a cabeça?
Desfita,
pois, o olhar dos longes do horizonte,
volta as costas ao mundo, eleva a Deus a fronte,
antes que o sol
de ponha, antes que a noite desça.
Ascensão
Atravessaste o vale, a planície florida,
absorto na visão dos encantos da estrada. Eis-te agora ao sopé da montanha da vida que irás subir a fim de alcançar a chapada.
Coragem, moço! Eu sei que é íngreme a subida.
Que importa? Vencerás, passada por passada, para a glória de o sol beijar-te a fronte erguida. - E depois? - É a descida, é a morte, é a volta ao nada...
Mas, tanto que atingi o cimo da montanha,
a fronte em suor, os pés em sangue, as mãos em brasa, senti que mergulhara em claridade estranha...
e a Verdade esplendeu em toda a intensidade:
é uma ascensão a vida! Eu necessito de asa para me erguer mais alto em rumo à Eternidade!
No cimo da
Montanha
Até que enfim
cheguei ao cimo da montanha
após uma jornada extensa e fatigante.
Passeio o olhar em torno e, pronto, o
olhar apanha
tudo que a vida tem de belo e
contrastante.
Possa ao menos fixar alguns dos
instantâneos
que mais funda impressão me causam; os
ouvidos
fechados
ao rumor de vozes e ruídos
onde há ranger de dentes e estalejar de
crânios.
Embaixo avisto o vale imenso,
entrecortado
em várias direções de rios e de estradas.
Crianças a
brincar imitando o bailado
das
borboletas, indo e vindo em revoadas.
Ônibus,
caminhões, caminhonetes e autos,
de cidade em
cidade, a correr, a voar.
E, sem matar ninguém, nem pedestres incautos,
carros de bois
gemendo ao sol, cantando ao luar.
Aqui, ali,
além, em meio das encostas,
mulheres, colo
e mãos, tendo jóias e anéis,
passam
cantando e rindo, enquanto em mãos postas
outras sobem,
sentindo embora em sangue os pés.
Entre umas e
outras vejo o número daquelas
que, no
desabrochar primaveril da idade,
o mundo as
seduziu, porque moças e belas,
e arrependidas, hoje, inclinam-se à verdade.
Homens a
pelejar com paciência e denodo
no afã de
conquistar o pão de cada dia;
outros, sem um
ideal, espojam-se no lodo,
lançam-se a
tudo o mais no turbilhão da orgia.
Alguém, que
pouco faz passeava na avenida,
sobe um
arranha-céu.. e do ponto mais alto
arremessa-se
ao chão e morre sobre o asfalto
tão só porque
não deu elevação à vida.
II
Alongo mais o olhar e avisto o campo santo,
leito derradeiro em que a morte nos deita... e em que a matéria sofre aos poucos, tanto e tanto, as decomposições a que ela está sujeita. Ali repousarão um dia os meus destroços.
Que importa que, voraz, a multidão dos vermes
passeie sobre o meu corpo, os meus membros inermes, sugue-me o sangue, coma-me a carne e roa-me os ossos! Ensinaram-me a ciência e a fé os dogmas seus: Se o corpo está sujeito à ação da gravidade, o espírito obedece às leis da eternidade: aquele volve à terra, este se eleva a Deus!
Por isso é que daqui, do cimo da montanha,
em que estou mais perto do céu vasto e profundo, sinto-me bem, pesar da dor que me acompanha,
em vendo tão pequeno e tão vazio o mundo.
Homens, que aí viveis como vermes de rastros.
E vos vangloriais - cegos que sois de ateus -
erguei o olhar aos céus, bebei a luz dos astros, acendei vossa fé nas lâmpadas de Deus. Para se conseguir excelência tamanha basta amar, basta amar e sofrer, só e só, no fervor de ascender, cada vez mais, do pó. Como é consolador o cimo da montanha!
E eu amei.. e eu sofri... Eu tenho os pés feridos
nas sarças do caminho. Eu guardo dentro d’alma
a ressonância, os ais de todos os gemidos, as preces dos que ouvi pedindo amor e calma.
Graças vos dou, meu Deus, graças vos dou, Senhor,
por sentir que me ergui dos abismos da treva,
por sentir mais intensa essa luz que me eleva,
suave irradiação do vosso imenso amor. |
2 comentários:
Um grande homem de um tempo que honestidade um dever do homem público. Passava esse encinamento em suas aulas. Tive o privilégio de ter sido seu aluno.
De fato, amigo, o nosso saudoso Cristiano Cartaxo foi um grande homem das letras, da cultura e da educação em nossa Cajazeiras.
Um abraço.
Postar um comentário